Sentei-me sozinha e em silêncio. Todos dormiam e ao meu
lado, alguns livros de linguagem estranha e uma caneca de café. Eu ainda
tentava me organizar por dentro, um redemoinho de pensamentos provocava um caos
em minha mente. O tempo se rastejava paradoxalmente, em pouco tempo muitas
horas já se passaram. Eu continuava sentada e em silêncio, não tocara em um
único livro. Uma sombra negra se movimenta na parede à minha frente, olho
fixamente para ela e não sinto medo.
Levo
a caneca à boca, mas o café já esfriou, eu sinto náuseas e cuspo o café de
volta na caneca. Minha boca fica amarga e rançosa. A sombra se movimenta e
parece crescer, ela caminha, descendo a parede até o vão da porta. Oito patas
finas e longas. A criatura se precipita num salto e fica suspensa num fio de
teia. Devagar, suas patas vão se enlaçando no fio e ela sobe, balançando-se na
passagem. Eu não posso me mover. Fico observando aquele ser tecendo seu ninho
na única saída do quarto em que eu estava.
A
cada fio armado, a aranha se tornava maior e a teia ficava mais densa para
sustentar seu peso. Até então, já teria se passado ¼ de hora ou ¼ de século e
quase toda a passagem já estava bloqueada pela teia. Era uma teia branca, de
aparência pegajosa. A criatura não cansava, parecia se tornar mais forte a cada
fio lançado e trançado. Aos poucos, minha vista se tornava turva. Aos poucos,
só o que eu podia ver era aquele vulto negro se contorcendo numa tapeçaria
branca.
Minha
respiração ficava pesada e uma espécie de torpor me dominava. Aranhas tecem
teias para capturar seu alimento, eu era a presa e estava aprisionada sem ao
menos tocar a armadilha. Eu estava aprisionada naquela estranha coreografia. Levantei-me
forçosamente, com um movimento brusco e desatento derrubei a caneca, o café se
espalhou sobre o chão e sobre os livros que também caíram, o som da louça e
estilhaçando soou como uma perfuração em meus ouvidos. Despertei momentaneamente
daquele quase-sonambulismo. Meus olhos foram sugados pelos olhos da aranha, ali,
na minha frente: oito olhos imensos de um negro espelhado, em cada um deles eu
via a imagem do meu rosto, era um rosto envelhecido, irreconhecível. Olhos fundos,
pele ressecada e enrijecida, boca pálida, aquele rosto parecia ruínas de um
tempo que eu nunca vivi.
Presa
aos olhos da criatura, nem percebi que ela preparava o ataque: a presa esta
pronta para ser devorada. Senti apenas o peso do corpo dela se abatendo contra
o meu, minha vista escureceu instantaneamente. Contudo, foi como um piscar de
olhos, um breve e pesado pisar de olhos. Quando os abri, ainda meio tonta e
desequilibrada pelo ataque, não havia mais nada no quarto, nem teia, nem
aranha. Tudo permanecia silencioso. Apoiei-me sobre a penteadeira ao meu lado e
me olhei no espelho, a luz era fraca, mas eu podia ver: meu rosto ainda era o
mesmo, mas em cada um dos meus olhos havia uma aranha negra tecendo uma teia de
fios brancos.
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